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PEÇA DO MÊS X – PORTA DE ARMÁRIO
Colecção: Museu Nacional de Arte Antiga (n.º de inv.º 1382 Mov)
Datação: 1490-1500
Proveniência: Desconhecida – doação da colecção José de Figueiredo (1938)
Local de Manufactura: Portugal (?)
Dimensões: Estimadas: ca. 150 cm de comprimento × 80 cm de largura
Peso: Desconhecido
Materiais: Madeira de carvalho, ferragens em ferro
Descrição: Porta em carvalho trabalhado, constituída por seis painéis decorados com padrão de linho pregueado inseridos num caixilho liso. Pequeno espelho de fechadura, provavelmente contemporâneo do resto da porta.

Na Idade Média, qualquer espaço doméstico necessita sobretudo de muito espaço de armazenamento. Ao longo do último mês mostrei que as arcas eram as peças de mobiliário medieval mais frequentes e versáteis em qualquer habitação medieval precisamente por este motivo, mas estavam longe de ser as únicas a oferecer armazenagem. Uma solução frequente era a criação de nichos e armários nas próprias paredes grossas da época – todas as soluções de espaço sem gastar extra em mobiliário.
Ao contrário dos armários plenos, peças de grandes dimensões e de grande custo – tão raros, por esse motivo, que António de Oliveira Marques disse não haver deles vestígio na documentação medieval portuguesa [1] -, criar um compartimento numa parede e fechá-lo com uma porta encastrada era relativamente acessível a quase todas as bolsas. Esta solução construtiva prestava-se a uma miríade de espaços e usos: armários para bens pessoais dentro de quartos e salões, armários para alfaias litúrgicas nas igrejas, armários para livros dentro de um scriptorium ou biblioteca, ou até conservação de armas em arsenais [2]…

A porta que aqui se vê, elaborada com esmero e mestria numa madeira cara, terá seguramente fechado um armário num espaço abastado, embora não saibamos qual. Tal como a arca que apresentei o mês passado, esta porta mostra painéis de linho pregueado, um dos padrões decorativos mais disseminados em trabalhos de carpintaria entre finais de século XV até meados de século XVI. Seria fechado com uma simples fechadura, o que, apesar de tudo, indica que teria resguardado bens com algum valor, já que a colocação de fechaduras não era condição sine qua non deste tipo de peças. A peculiaridade desta porta em particular são as duas tábuas laterais da moldura que se prolongam para baixo, formando o que seriam sapatas – potencialmente indicando que esta peça faria parte de um armário independente e não de um armário de parede, ao contrário do que o Museu Nacional de Arte Antiga indica. Ainda assim, em benefício da dúvida, mantenho a designação de uso que o MNAA lhe decidiu dar.
Tal como o restante mobiliário, este género de peças podia ser feita de madeiras várias, com preferência óbvia do carvalho. Ao contrário das peças de mobiliário mais móveis, estas portas de armário eram colocadas directamente contra as paredes, o que signficava terem de ser construídas em materiais resistentes à humidade que assolava frequentemente os espaços medivais e, portanto, em madeiras mais duras, que dobrassem menos com o passar do tempo e com o uso.
[1] Oliveira Marques, A. (2010). A Sociedade Medieval Portuguesa – Aspectos do Quotidiano. Lisboa: Esfera dos Livros, p. 107. Oliveira Marques ter-se-á esquecido certamente de uma carta de D. Pedro em que se acusava a má conservação a que as armas estavam sujeitas nos castelos portugueses “per mingua de tres ou quatro taboas de que fizerom hu almario” em que as conservar. Em Monteiro, J. G. (2001). Armeiros e Armazéns nos Finais da Idade Média. Viseu: Palimage Editores, p. 25.
[2] Tal como apontado na nota anterior.
BIBLIOGRAFIA
Eames, P. (1977). Furniture in England, France and the Netherlands from the Twelfth to the Fifteenth Century. Furniture History, 13. London: The Furniture History Society
Monteiro, J. G. (2001). Armeiros e Armazéns nos Finais da Idade Média. Viseu: Palimage Editores
Oliveira Marques, A. (2010). A Sociedade Medieval Portuguesa – Aspectos do Quotidiano. Lisboa: Esfera dos Livros
FONTES VISUAIS
Facta et dicta memorabilia (ca. 1479). London: British Library, Royal 18 E III
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